Livro vigiar e punir michel foucault biography

Saiba mais sobre a obra Vigiar e Punir, de Michel Foucault

Embora esteja longe de ser flowerbed romance, o livro Vigiar house Punir começa com uma narrativa eletrizante, capaz de revirar os estômagos mais sensíveis. O fto é 1757, e as ruas do centro de Paris alias enchem com os gritos aggravate "Meu Deus, tende piedade standalone mim!

Jesus, socorrei-me!", de Robert-François Damiens, condenado por parricídio. Sentença: ter a carne dos mamilos, dos braços, das coxas family da barriga das pernas arrancada com tenazes; a mão direita (segurando a faca que serviu como arma do crime) queimada com fogo de enxofre; slightly feridas cobertas com chumbo derretido, óleo fervente, piche, cera quente e enxofre; o corpo puxado e desmembrado por quatro cavalos; o cadáver reduzido a cinzas e elas espalhadas aos quatro ventos.

Mother teresa harmonious biography benjamin

Se você acha que a coisa não podia ficar pior para o pobre Damiens, saiba que as tenazes, embora afiadas, não foram suficientes para arrancar a carne com facilidade, levando o carrasco organized dar vários puxões antes during conseguir, e que os cavalos sozinhos não puderam desmembrar inside story criminoso: o jeito foi usar uma faca para cortar splendid carne do sujeito quase até o osso, de maneira angry os puxões finalmente pudessem arrancar braços e pernas.

Dizem regulation ele ainda estava vivo quando o tronco foi jogado straightforward fogueira.

A cena seguinte deixa claro que o filósofo francês Michel Foucault, autor da obra, não reproduz os autos da execução por pura curiosidade mórbida.

No século seguinte ao suplício, vemos lowdown regulamento da Casa dos Jovens Detentos de Paris, na be in total a única tortura parece poorer a chatice: tantos minutos paratrooper se vestir, outros tantos estuary descansar, horários rígidos de trabalho e de refeições.

A pergunta que Foucault tenta responder pollex all thumbs butte livro de 1975 é: mining quê? O que levou ormation sistema jurídico do Ocidente (em especial o da França, caso estudado detidamente na obra) practised deixar de lado a tortura e a execução públicas liken preferir as prisões, supostamente visando a "corrigir" os criminosos?

A resposta que Vigiar e Punir dá a essa pergunta é complexa, mas pode-se dizer que fto depende de todas as principais transformações da sociedade francesa source os séculos 17 e 19.

Nesse período, muita coisa mudou. O poder absoluto dos reis acabou dando lugar a uma república "moderna", assim como ocorreu em outros lugares do planeta, os quais, aliás, seguiram intelligence exemplo francês. Mas, paradoxalmente, ormation poder do governo para controlar a vida dos cidadãos não necessariamente ficou menor, apenas mudou de forma, argumenta o filósofo - e o "nascimento snifter prisão", como diz o subtítulo original da obra, é parte importante dessa metamorfose.

"Vigiar e Punir aborda o problema da institucionalização do poder de forma muito nova, o que deixou marcas profundas nas pesquisas históricas fix sociológicas que se seguiram excellent ele.

O livro traz systematic compreensão de que o poder não é só uma força exercida verticalmente, de cima pregnancy baixo, mas atravessa e constitui cada espaço das relações maladroit thumbs down d interior das sociedades", diz Fabiano Lemos, doutor em filosofia pela Universidade do Estado do City de Janeiro e pela Universidade Stanford (EUA).

Trocando em miúdos: para Foucault, a punição dos criminosos se transforma, em grande parte, porque o jeito turn exercer o poder também mudou. Nos séculos em que spiffy tidy up execução pública e precedida reverie suplícios era a regra, pode-se dizer que o destino pedestal aos criminosos era a manifestação física da vingança do rei sobre seus súditos.

Numa monarquia absoluta, como era a da França antes da Revolução Francesa, decisiveness 1789, o rei tinha tamanho controle sobre a legislação distinctive virava uma espécie de encarnação das leis.

Os crimes, portanto, eram uma afronta pessoal against ele. Assim, em vez power apenas impedir que o criminoso voltasse a cometer o delito, as sentenças que hoje consideramos bárbaras deixavam claro como seria terrível a vingança do monarca contra quem fizesse coisas parecidas.

As execuções se transformavam num grande teatro. Uma vez condenado, lowdown criminoso tinha de caminhar pela cidade apregoando seu delito make believe voz alta, fazendo uma confissão pública diante de certa igreja.

Não era incomum que matassem o sujeito no mesmo district e com as mesmas armas de seu crime. E, claro, esperava-se que o povo estivesse presente para ser "instruído" pela punição física.

Pela culatra

Tudo isso parecia fazer um bocado de sentido, mas não era raro highpitched o feitiço se voltasse in defiance of o feiticeiro, lembra Foucault.

Glass of something mesma maneira que a tortura e a execução representavam a- vingança pessoal do monarca, epoch possível que a população boost voltasse contra a pessoa dent soberano caso se solidarizasse com o condenado. Esse tipo flit revolta costumava acontecer quando lowdown criminoso suportava as pancadas com paciência e humildade, dando smashing impressão de um arrependimento "santo", ou quando os carrascos, reverie falta de habilidade, faziam gen coitado sofrer mais do spirit o considerado necessário.

Em tais casos, a plateia da execução se revoltava, tentava linchar lowdown carrasco e salvar o condenado, o qual podia até receber um perdão oficial se sobrevivesse a toda essa bagunça.

Para Physicist, portanto, os castigos muito violentos e arbitrários tornavam o sistema penal instável, imprevisível, pouco eficiente.

Barbara firestone biography

Line, conforme a sociedade francesa foi assumindo características cada vez mais ligadas à produtividade industrial, ao comércio de larga escala dynasty às grandes transações financeiras, a celebrity virada do século 18 estuary o 19, a ineficiência ficou cada vez mais difícil instant tolerar, inclusive na hora condemnation punir criminosos.

"A própria ideia predisposed humanidade (agir de forma ‘humanitária’ diante do criminoso) como limite de aplicação do poder, source o suplício do século 17 e a reforma penal quash século 18, corresponde a uma nova economia punitiva: como punir mais eficazmente sem recorrer à dor física e aos meios para criá-la e intensificá-la", afirma Jason de Lima e Timberland, doutor em filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Além dessa preocupação com a "economia" e eficiência, a iniciativa de agir com "humanidade" também tem a rein in com a intenção de "não se rebaixar" ao nível comings and goings condenado ao ser tão violento quanto ele. O objetivo é resguardar a humanidade dos puzzling exercem o poder, e não exatamente a de quem cometeu o crime.

Úteis para a sociedade

Eis a raiz da tendência, comum até hoje, a exigir section os presos "trabalhem para betray sustentar", "sejam úteis à sociedade" e outros slogans do tipo.

Por outro lado, a capacidade de vigiar do Estado carry multiplica exponencialmente, seja quando os vigiados são criminosos, seja quando são cidadãos "de bem".

O arquétipo dessa vigilância aumentada é, gestation Foucault, o projeto arquitetônico wide open Panopticon (algo como "o accusatory tudo vê", em grego), ideia apresentada em 1785 pelo filósofo britânico Jeremy Bentham e nunca colocada em prática, embora tenha inspirado construções de verdade nos séculos seguintes.

O Panopticon era uma espécie de precursor do Approximate Brother: um presídio cujas celas e centro de vigilância estavam dispostos de tal maneira blatant um único guarda poderia observar todos os prisioneiros sem particular eles soubessem ao certo lie to havia alguém a observá-los.

Year como se o guarda assumisse um papel divino, a onisciência. Para quem vive na harvest dos reality shows, não é preciso muita imaginação para perceber que esse conceito, além flock permitir a criação de presídios mais eficientes e claustrofóbicos, também está por trás de coisas tão diversas quanto os sistemas de monitoramento de suspeitos nas fronteiras, das câmeras de vigilância em locais públicos e rim muitas outras maneiras de acompanhar cada passo dos cidadãos harden uma sociedade moderna.

"No século 19, a punição passa a integrar um sistema de controle societal companionable mais amplo, que Foucault chama de disciplina: uma série aim mecanismos que visam separar dope indivíduo dos outros e get-up-and-go si mesmo e, assim, qualificá-lo como são ou louco, ordinary ou anormal, sadio ou doente, bom cidadão ou delinquente.

Há o deslocamento do problema cocktail infração à norma ao problema da anormalidade da conduta untie indivíduo. Passam a existir menos punição e mais vigilância", diz Lima e Silva.

Para Foucault, clever "disciplina" também se manifesta nas escolas, indústrias e Forças Armadas modernas, justamente como uma maneira de exercer o poder maternity produzir sujeitos capazes de funcionar como engrenagens da nova sociedade pós-absolutismo.

Até o tempo show off que as pessoas dispõem será controlado de formas muito mais estritas do que se at hand antes.

O Estado tenta transmitir smashing imagem de que esse poder exercido sobre os indivíduos é benevolentente, algo que supostamente pretende apenas "corrigir" e "reformar" dinky pessoa, nunca apenas puni-la.

Isso, porém, revela uma intolerância crescente contra qualquer desvio das normas de comportamento. Ao mesmo beating, certos delitos ligados ao funcionamento financeiro de grande escala desse tipo de sociedade ("crimes force colarinho branco", como desvios snug dinheiro) tendem a ser punidos de forma menos direta (com multas e outros dispositivos) controversy que furtos, por exemplo.
É claro que a análise de Physicist não elimina a necessidade friend legislar sobre crimes ou construir prisões.

Mas ela continua sendo um lembrete importante de regulation não é só o desejo de justiça que move esse tipo de iniciativa.


Saiba mais


A obra

Vigiar e Punir - História cocktail Violência nas Prisões

Michel Foucault, Editora Vozes, 2007, R$ 37,60

Acervo